Não se pode querer anular, automaticamente, as provas provindas de uma delação, por omissão ou mentira dos colaboradores!
Após a revelação dos áudios de Joesley Batista e Ricardo Saud da JBS há duas semanas e os seus depoimentos logo após, com a decretação da prisão pelo STF em seguida, a pergunta supra é mais do que pertinente, até mesmo porque desde o acordo firmado entre a Procuradoria da República e os empresários, com isenção total de responsabilidade penal, a sociedade ficou, como se diz, com a “pulga atrás da orelha”
A resposta de plano deve ser afirmativa, pois da própria essência do acordo, temos a peculiaridade de que as afirmações trazidas pelos colaboradores têm de ser confirmada com outras provas, bem assim sempre consta cláusula de que os beneficiados não podem mentir ou omitir, logo tais caracteres nos autorizam a enunciar de forma positiva, contudo, por outro lado, isso não significa que as provas existentes percam a sua validade.
Não podemos confundir os institutos e tanto é verdade que o PGR teve o cuidado quando da revelação dos referidos áudios em falar de rescisão, na linha de uma revisão do que ficou acertado e não necessariamente anulação, com invalidação de todos os atos subsequentes que aconteceram após a delação, até mesmo porque o devido processo legal, independentemente, desse peculiar fato tem que ter continuidade.
O alarde feito na imprensa nesse momento se dá muito mais pelo próprio início conturbado da delação e o envolvimento do Presidente da República do que os fatos posteriores, eis que quando da homologação da referida delação pelo STF, tais premissas restaram externadas e tanto é verdade que três integrantes, Fux, Marco Aurélio e Celso de Mello publicizaram tal linha de pensar, que por óbvio não pode ser diferente.
Sobre o referido processo, vejamos algumas cláusulas do acordo:
A prova obtida mediante o presente acordo será utilizada validamente para a instrução de inquéritos policiais, procedimentos administrativos criminais, medidas cautelares, ações penais, ações cíveis e de improbidade administrativa e inquéritos civis, podendo ser emprestada também aos :Ministérios Públicos dos Estados, à Receita Federal, à Procuradoria da Fazenda Nacional, ao Banco Central do Brasil, à Controladoria-geral da União, ao Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência – CADE e a outros órgãos, inclusive de países e entidades estrangeiras, para a instrução de procedimentos e ações fiscais, cíveis, administrativos, inclusive disciplinares, de responsabilidade bem como qualquer outro procedimento público de apuração dos fatos, mesmo que rescindido este acordo, salvo se essa rescisão se der por descumprimento desta avença por exclusiva responsabilidade do Ministério Público Federal.
E também:
Em caso de rescisão do acordo por sua responsabilidade exclusiva, o COLABORADOR perderá automaticamente direito aos benefícios que lhe forem concedidos em virtude da cooperação com o Ministério Público Federal, *permanecendo hígidas e válidas todas as provas produzidas, inclusive depoimentos que houver prestado e documentos que houver apresentado, bem como válidos quaisquer valores pagos ou devidos a título de multa.
Mais precisamente sobre o instituto:
“O acordo de colaboração premiada, desde que regularmente homologado por órgão judiciário competente, configura ato jurídico perfeito, do qual resulta, quando cumprido pelo colaborador, direito subjetivo que lhe garante acesso aos benefícios de ordem legal”.
“O acordo de colaboração premiada regularmente homologado, qualquer que tenha sido a instância perante a qual celebrado, qualifica-se como ato jurídico perfeito, revelando-se insuscetível de modificação, ressalvadas as hipóteses de seu descumprimento por parte do colaborador ou da superveniência de causa legítima apta a desconstituí-lo”. (Ministro Celso de Mello, Decano do STF).
*Descarte de provas*
De acordo com Celso de Mello, o decano da Corte, com a possível anulação, as provas só poderão ser descartadas se forem as únicas a basear as acusações contra terceiros. “Na eventualidade de uma revisão do acordo de colaboração premiada, ainda que o fato seja imputável ao agente colaborador, em havendo a rescisão, as provas coligidas a partir do depoimento, em relação a terceiras pessoas, vale dizer, em relação aos delatados, elas são válidas”
Ontem o STF foi enfático em enunciar que a revisão da delação não gera automaticamente a anulação das provas nela contidas e que o momento correto para se aferir isso só ocorrerá, pelo STF, acaso haja autorização da Câmara dos Deputados em juízo muito mais político que jurídico, este ficando condicionado a tal autorização e a ser feito pelo Judiciário quando do retorno da denúncia que já será enviada, já que a maioria do STF assim já se posicionou, 7×1, faltando, tão somente, os votos de Marco Aurélio, Celso de Mello e da Presidente Carmén Lúcia.
A linha da defesa de Temer que queria que não fosse enviada a referida peça para a Câmara dos Deputados, e que a mesma retornasse a PGR só foi acolhida por Gilmar Mendes, eis que a própria Raquel Dodge não concordou com reenvio em memorial acostado ao feito, logo a denúncia seguirá para a Câmara dos Deputados, que irá deliberar se autoriza ou não a continuidade do processo contra o Presidente, logo tal questão é crucial, não só para esse peculiar caso, mas para todos os demais, já que o colaborador mentir ou omitir, é um risco peculiar ao próprio instituto e não, com todo respeito, da forma trazida pelo referido Ministro, que queria analisar tudo agora e aparentemente pela fala dura e pessoal contra Janot, anular tudo.
No nosso sentir, as provas trazidas após a colaboração não podem ser atingidas pela particularidade de sua autonomia e sua patente origem lícita, logo o que pode e deve ser revisto são os benefícios dados aos delatores por justamente terem descumpridos a sua parte no negócio jurídico e tanto é verdade que o PGR já pediu suas prisões e foram decretadas porque a partir da quebra da fidúcia, tem que haver a devida revisão, sob pena dos criminosos se beneficiarem de sua própria torpeza e isso é inadmissível!
Nesse processo complexo, pensamos que não se devem tirar conclusões precipitadas, até mesmo porque a maioria das pessoas que o comentam, como nós mesmos, não temos todos os elementos e na realidade não só pela qualidade de julgador e os limites que temos, a cautela recomenda explicar a população o instituto e suas nuances sem precisar as consequências, por não se ter todo o campo de cognição, logo esperamos minimamente ter contribuído de modo que os cidadãos continuem vigilantes, já que a delação, por si só, não significa impunidade!
Por: Herval Sampaio.
Fonte: novoeleitoral.com
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