Recentemente, cinco conselheiros e um ex-conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ) que foi Presidente do órgão tiveram prisões temporárias decretadas na Operação Quinto do Ouro, que investiga o desvio de dinheiro público envolvendo membros deste tribunal e também da Assembleia Legislativa do Estado carioca.
Não vamos fazer nenhum juízo de valor sobre a operação em específico; primeiro porque não temos elementos concretos para tal, segundo porque quando se começa uma investigação, todo prejulgamento é açodado e fere a garantia constitucional do devido processo legal http://novoeleitoral.com/index.php/artigos/hervalsampaio/789-lista-fachin-democracia-alto-custo-devido-processo-legal ; terceiro porque como juiz tem impeditivo legal de comentar casos concretos que se encontram sob judice como é o presente caso.
Em meio a tantos escândalos de corrupção nos mais diversos órgãos públicos, renova-se o debate necessário sobre a inadiável reforma na indicação para a composição dos Tribunais de Contas, pois infelizmente se tem um órgão que deveria ser o mais técnico possível, este órgão é a Corte de Contas que deve passar longe da politicagem que domina o cenário administrativo.
Pela Constituição Federal vigente, os Tribunais são compostos de pessoas nomeadas. No caso da União, são indicadas um terço pelo Presidente e dois terços pelo Congresso Nacional (art.73, § 2º, CF). No âmbito dos Estados, são três membros escolhidos pelo Governador (art. 235, inciso III, CF). Vejam como a discricionariedade na escolha facilita a politicagem, já que o complemento do ato pela Casa Legislativa na prática é meramente protocolar, com raras exceções que justamente enunciam a regra geral que ora condenamos.
Entretanto, como pode um órgão técnico ser formado por pessoas sem o conhecimento específico para tal? Esses Tribunais possuem uma importante função fiscalizatória e julgadora, oportunidade em que se analisam a adequada destinação e aplicação do erário público, penalizando gestores que infrinjam a legislação. Mas como será possível fazer isso com imparcialidade e segurança jurídica, se aliado à esses julgamento, está a indicação política?
Entendemos que uma das funções mais importantes, hoje de um homem público, é justamente a função fiscalizatória, porque quando bem feita o princípio da eficiência se faz presente na prática. Trazemos como exemplo um vereador atuante nessa função, como destacamos http://novoeleitoral.com/index.php/artigos/hervalsampaio/112-vereador
Esse debate acerca da forma de escolha dos membros não é recente. Tanto que em 2013 foi proposto uma alteração na Lei Maior: a PEC n° 329/2013 apresentada pela Frente Parlamentar Mista de Combate à Corrupção. Atualmente o projeto está na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) onde recebeu parecer pela admissibilidade do Relator, Deputado Alessandro Molon (REDE-RJ).
O texto propõe modificar a forma de composição dos Tribunais de Contas, submetendo os membros do Ministério Público de Contas ao Conselho Nacional do Ministério Público – CNMP e os Conselheiros e Ministros dos Tribunais de Contas ao Conselho Nacional de Justiça – CNJ, além de dispor sobre outras providências.
É escancarada a urgência e imprescindibilidade dessa reforma. A norma presente na nossa Constituição é retrógrada e não se coaduna com os valores levantados em outros dispositivos constitucionais, não refletindo os princípios da transparência e eficiência como qualidade do serviço público prestado. Um órgão de natureza eminentemente técnica deveria ser integrado por pessoas peritas na área, que pudessem explorar ao máximo todas as nuances e situações levadas a questionamento e não seu voto no Tribunal ser tangenciado por outros fatores.
Entretanto, o que vemos constantemente é a ineficácia, o julgamento de mentirinha, a fiscalização faz-de-conta, que a sociedade não suporta mais e estamos vendo os resultados nefastos através dessas últimas operações.
Não tem quem mais aguente a indicação política em órgãos que essencialmente são técnicos!
A reforma que busca a PEC supracitada na CF visa justamente acabar com as influências político-partidárias sobre esses órgãos e principalmente sobre seu trabalho, fazendo com que suas decisões sejam tomadas com imparcialidade, lisura e de forma técnica.
Essa semana, o IBDA (Instituto Brasileiro de Direito Administrativo) emitiu nota em que apoia a modificação no modelo constitucional das Cortes de Contas, no tocante à sua composição. Vejamos:
“Reforma dos Tribunais de Contas: Carta Aberta
Os professores de direito público abaixo identificados, nutrindo em comum o sentimento de profundo respeito pelo princípio republicano e pelo Estado Democrático de Direito, ambos dependentes de mecanismos de controle externo da Administração Pública voltados à preservação da probidade, eficácia, eficiência e economicidade na atividade financeira do Estado, manifestam sua preocupação com as notícias recentes que reforçam a necessidade de reformas no modelo constitucional dos Tribunais de Contas. No tocante à composição das Cortes de Contas, é necessário construir um modelo pautado na predominância de membros oriundos de carreiras públicas providas mediante concurso público, pois a maioria provida por indicação política não se justifica em um órgão que possui atribuições essencialmente técnicas. Não obstante, é preciso aproximar o regime jurídico das sujeições dos membros dos Tribunais de Contas ao aplicável aos membros da magistratura, pois a Constituição já determina paridade de garantias, prerrogativas, impedimentos, vencimentos e vantagens entre Conselheiros e Juízes. Para tanto, é importante que os membros das Cortes de Contas estejam sujeitos ao Conselho Nacional de Justiça-CNJ, órgão constitucionalmente responsável pela observância do cumprimento dos deveres funcionais dos magistrados e pelo respeito, em sua atuação, aos princípios constantes do art.37 da Constituição. Finalmente, é importante adotar medidas para o reconhecimento da autonomia do Ministério Público de Contas, bem como a submissão dos membros da instituição ao Conselho Nacional do Ministério Público. As reformas devem ser discutidas com seriedade e serenidade, com atenção às peculiaridades da atividade de controle externo, com o intuito de garantir que seja possível construir um novo modelo de Tribunal de Contas que mereça a respeitabilidade da sociedade e ocupe a vanguarda no combate à corrupção, evitando o desperdício de recursos, punindo desvios e contribuindo efetivamente para a melhoria da gestão pública.
Adílson Dallari (SP)
Bernardo Strobel (PR)
Carolina Zancaner Zockun (SP)
Celso Antônio Bandeira de Mello (SP)
Clóvis Beznos (SP)
Cristiana Fortini (MG)
Christianne Stroppa (SP)
Daniel Ferreira (PR)
Daniel Sarmento (RJ)
Daniela Libório (SP)
Dinorá Grotti (SP)
Edgar Guimarães (PR)
Élida Graziane Pinto (SP)
Eneida Desiree Salgado (PR)
Eurico Bitencourt Neto (MG)
Fabrício Motta (GO)
Fernando Mânica (PR)
Heleno Taveira Torres (SP)
Ingo Sarlet (RS)
Irene Nohara (SP)
José Maurício Conti (SP)
Júlio Cesar S. Esteves (MG)
Lígia Melo (CE)
Márcio Cammarosano (SP)
Maria Sylvia Zanella Di Pietro (SP)
Maurício Zockun (SP)
Paulo Modesto (BA)
Paulo Ricardo Schier (PR)
Rafael Valim (SP)
Raquel Melo Urbano Carvalho (MG)
Regina Nery Ferrari (PR)
Ricardo Marcondes Martins (SP)
Rodrigo Pironti Aguirre de Castro (PR)
Sérgio Ferraz (RJ)
Sérgio Guerra (RJ)
Sílvio Luís Ferreira da Rocha (SP)
Tarso Cabral Violin (PR)
Valmir Pontes Filho (CE)
Vanice Lírio do Valle (RJ)
Vívian Lopes Valle Quinta (PR)
Vladimir Rocha França (RN)”
Assim, torna-se inadmissível que em tempos onde se busca cada vez mais acabar com a politicagem, a Constituição possa dar caminhos para que a corrupção possa se instalar justamente em órgãos que deveriam ser exemplo para todos os demais porque os fiscalizam.
A indicação política aos Tribunais de Contas pode até (ainda) ser legal do ponto de vista jurídico formal, mas é antiético do ponto de vista da moralidade, que hoje também integra os princípios que compõem a administração público como categoria autônoma.
E mais a decência e a honestidade são superiores a qualquer ordenamento jurídico, o que não é o caso do nosso, que como visto traz na essência da atuação de qualquer homem público o cumprimento do princípio da moralidade e este não se coaduna com muito dos acontecimentos noticiados, sendo imperioso que haja uma reforma para ontem na forma de composição.
Sinceramente, no quadro atual, é o mínimo que podemos esperar de políticos verdadeiramente comprometidos com o interesse público, contudo o grande problema está justamente aí, já que para a grande maioria ter alguém no Tribunal de Contas chancelando seus atos de corrupção como se fosse legal é um elemento importante de toda a engrenagem de se manter no poder a todo custo.
Por Herval Sampaio.
Fonte: novoeleitoral.com
Deixe uma resposta